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A música tem o poder de transcender barreiras e se conectar com as pessoas, de maneiras que palavras, muitas vezes, não conseguem.
Para crianças com autismo, a musicoterapia se estabeleceu como uma prática terapêutica baseada em evidências, com benefícios concretos para o desenvolvimento em diversas esferas e bem-estar.
Neste artigo, entenderemos a conexão entre a musicoterapia e o autismo, aprofundando como essa abordagem terapêutica pode oferecer suporte significativo para crianças que enfrentam desafios únicos de comunicação, interação social e regulação emocional. Acompanhe!
O que são práticas baseadas em evidências?
As práticas baseadas em evidências científicas são um conjunto de procedimentos que foram estudados por pesquisadores, cujos resultados se mostraram positivos para beneficiar alguma população específica.
No caso do TEA, as PBEs são aquelas cujos resultados têm beneficiado pessoas no espectro a se desenvolverem.
Das 28 práticas baseadas em evidências para o TEA que atingiram todos os critérios propostos pela revisão do ASAT, 23 eram baseadas nos princípios da Análise do Comportamento Aplicada (ABA).
Apesar de pouco conhecida, quando comparada a terapias como ABA, Método Denver, fonoaudiologia e terapia ocupacional, a musicoterapia foi reconhecida como uma das práticas baseadas em evidências recomendadas para o autismo no Evidence-Based Medicine, publicado pela Associação para a Ciência no Tratamento do Autismo (ASAT, na sigla em inglês) em 2014.
O que é musicoterapia?
A musicoterapia é uma forma de terapia que utiliza a música como principal meio de comunicação e expressão emocional, promovendo o bem-estar físico, emocional, mental e social.
É uma prática baseada no uso terapêutico dos elementos musicais, como ritmo, melodia, harmonia e letra, para promover mudanças positivas na saúde física, emocional, cognitiva e social de uma pessoa.
Ela tem se mostrado uma abordagem terapêutica indicada para intervenções no autismo, principalmente no que diz respeito a melhora da comunicação, interação social, expressão emocional e habilidades cognitivas.
Na musicoterapia, um terapeuta treinado usa elementos musicais, como ritmo, melodia e harmonia, juntamente com a interação com a pessoa, para atingir objetivos terapêuticos específicos.
Assim, a essência da musicoterapia está na capacidade da música de comunicar, motivar, inspirar e proporcionar um meio de expressão não verbal para aqueles que não conseguem se comunicar através da fala.
Para crianças com autismo, a musicoterapia desempenha um papel vital na promoção da comunicação, interação social, redução do estresse e ansiedade, desenvolvimento cognitivo e motor, além de oferecer uma maneira única de expressar emoções e sentimentos.
A musicoterapia como prática baseada em evidências
As práticas baseadas na musicoterapia misturam um conjunto de elementos, como arte, saúde e neurociência, para a realização de intervenções. Essa terapia ajuda no desenvolvimento de áreas como:
- Comunicação (vocal e não vocal);
- Expressão;
- Aprendizagem;
- Organização.
Os casos mais comuns de suas aplicações são para promover a saúde, reabilitar a pessoa, prevenir o agravamento de condições neurológicas degenerativas, além de promover o bem-estar e qualidade de vida.
Um detalhe importante é que não existem recomendações de que essa intervenção funciona melhor com determinados tipos de pessoa.
Assim, independente do grau de comprometimento cognitivo e/ou motor – o que pode fazer com que a pessoa não consiga participar ativamente da terapia – ela ainda pode ocorrer e beneficiar o indivíduo.
Ela também pode ser realizada individualmente ou em grupo, sendo que cada modelo tem seu próprio benefício para quem o faz.
Quem pode aplicar musicoterapia?
Para atuar como musicoterapeuta, o profissional precisa ter formação em Musicoterapia. Esse curso de ensino superior tem titulação de bacharelado e traz disciplinas do curso de música e do campo da neurociência.
Além disso, profissionais que já têm ensino superior completo e desejam atuar como musicoterapeutas podem fazer uma pós-graduação na área.
Tipos de musicoterapia
Existem diferentes formas de aplicar as estratégias de musicoterapia como intervenção musical.
Essa diversidade permite que os terapeutas adaptem a prática de acordo com as necessidades individuais de cada pessoa, incluindo crianças com autismo e seus repertórios específicos.
Veja algumas delas:
Analítica
Encoraja o indivíduo a fazer uso de um “diálogo” musical improvisado, cantando ou tocando um instrumento para expressar seus pensamentos inconscientes. Assim, espera-se que ele possa refletir e discutir com seu terapeuta tudo que foi dito posteriormente.
Benenzon
Este formato combina conceitos da psicanálise com o processo de criação musical, que inclui a busca da sua “identidade sonora musical”, ou seja, descreve sons externos que mais se aproximam do seu estado psicológico interno.
Cognitivo-comportamental
Já a Cognitivo-comportamental é uma abordagem que combina a terapia cognitivo-comportamental (TCC) com a música. Nesse modelo, a música é usada para reforçar alguns comportamentos e modificar outros. Essa abordagem é estruturada, não improvisada, e pode incluir ouvir música, dançar, cantar ou tocar um instrumento.
Comunitária
Este formato está focado no uso da música como forma de facilitar a mudança no nível da comunidade. É feito em um ambiente de grupo e requer um alto nível de envolvimento de cada membro para que sua realização ocorra.
Nordoff-Robbins
Também chamada de musicoterapia criativa, esse método envolve tocar um instrumento (geralmente um prato ou tambor) enquanto a terapeuta acompanha o uso de outro instrumento. O processo de improvisação usa a música como forma de ajudar a possibilitar a autoexpressão.
Método Bonny de imaginação guiada e música
Esta forma de terapia usa a música clássica como forma de estimular a imaginação. Neste método, o indivíduo explica seus sentimentos, sensações, memórias e imagens que experimenta enquanto ouve a música.
Psicoterapia vocal
Já neste formato, o indivíduo usa vários exercícios vocais, sons naturais e técnicas de respiração para se conectar com suas emoções e impulsos. Essa prática visa criar um senso mais profundo de conexão consigo mesmo.
Como a musicoterapia ajuda pessoas com autismo?
A musicoterapia se destaca como uma valiosa abordagem terapêutica para pessoas com autismo, oferecendo uma variedade de benefícios significativos.
Através do poder da música, essa forma de terapia auxilia no aprimoramento da comunicação, na promoção da interação social, na expressão emocional e no desenvolvimento das habilidades cognitivas.
Por meio de técnicas musicais adaptadas e atividades personalizadas, ela proporciona um ambiente seguro e acolhedor, incentivando o crescimento e a transformação das pessoas autistas.
Estudos já realizados demonstram que essa terapia é um método eficaz e cujos resultados são positivos para a melhoria de habilidades em crianças com TEA. Entre seus benefícios para o autismo estão:
- Estimulação sensorial: a música oferece uma variedade de estímulos sensoriais, como sons, ritmos e vibrações. Esses estímulos podem ser especialmente atraentes e envolventes, ajudando a desenvolver habilidades de percepção sensorial e a lidar com a hipersensibilidade ou hiposensibilidade.
- Melhoria da comunicação: a música é uma forma de comunicação não verbal que pode ser mais acessível para pessoas com dificuldades de comunicação verbal. Ela pode ajudar a estabelecer conexões emocionais e promover a expressão de sentimentos e pensamentos; e pode ser usada para melhorar habilidades vocais e de linguagem, como entonação, ritmo e articulação.
- Desenvolvimento social e interação: a terapia pode facilitar a interação social, encorajando a participação em atividades musicais em grupo, como tocar instrumentos em conjunto, cantar ou dançar. Justamente pela música proporcionar um ambiente seguro e estruturado para a interação, promovendo o compartilhamento de experiências e o trabalho em equipe.
- Estímulo do desenvolvimento motor: a musicalização pode ser utilizada para desenvolver habilidades motoras, como coordenação motora fina e grossa. Toques rítmicos e jogos musicais que envolvem movimento podem ser usados para aprimorar o controle motor e a consciência corporal.
- Alívio do estresse e ansiedade: alguns sons têm efeitos relaxantes e podem ajudar a reduzir o estresse e a ansiedade. Através da musicoterapia, as pessoas autistas podem aprender estratégias de regulação emocional, como técnicas de respiração e relaxamento, que podem ser úteis em situações estressantes.
Jovem com autismo cria sinfonia mental a partir da musicoterapia
Em uma reportagem do programa de TV “Fantástico” no dia 29 de outubro de 2023, conseguimos acompanhar o impacto que a musicoterapia tem no desenvolvimento de habilidades de pessoas autistas.
Jacob, um jovem autista de 19 anos, com repertório verbal restrito a duas palavras “comer” e “sim”, e que usa gestos para apontar aquilo que precisa, criou uma sinfonia mental.
O pai do garoto contou à reportagem que “a questão principal do filho era a motora, já que o corpo não sabia responder direito”. Assim, quando Jacob aprendeu a teclar, ele conseguiu mostrar que sabia ler, soletrar e criou uma sinfonia em sua mente.
Um amigo da família, transformou em partituras instruções de Jacob e se surpreendeu com a evolução do menino. Assim, em trocas constantes, os dois construíram as partituras tudo que era digitado, criando música por meio de cliques.
A convite do Fantástico, a Orquestra Petrobras Sinfônica interpretou a partitura de Jacob e contou que “o som dentro dele é todo descrito. Ele compõe em forma de frases, explicando a música com palavras, como: violinos atacam trompetes”.
A musicoterapia substitui outras intervenções para autismo?
Apesar de todos esses benefícios, a musicoterapia não substitui as intervenções como ABA, Método Denver, fonoaudiologia e terapia ocupacional para o autismo.
Ela pode ser usada como um recurso adicional a essas intervenções que também são importantes para o desenvolvimento de pessoas com autismo.
Por isso, é fundamental conversar com a equipe que acompanha o desenvolvimento da pessoa no espectro, e entender quais estratégias da musicoterapia podem ser aplicadas na rotina, sempre complementando o que já está sendo feito.
Também é importante lembrar de respeitar o perfil específico de cada criança. Nem todas as crianças podem se adaptar ou interessar por música como forma de intervenção, e tudo bem. Cada plano de ação precisa ser feito pensando no gosto individual.
Conclusão
A musicoterapia é uma prática baseada em evidências que oferece inúmeras vantagens para crianças com autismo.
Lembre-se de que a chave está na personalização e na escolha de um terapeuta qualificado para garantir o melhor atendimento possível. A música, afinal, é uma linguagem universal que transcende as barreiras, e é um caminho para a expressão e o crescimento.
Para conhecer mais sobre as práticas baseadas em evidências para o autismo e demais intervenções, leia nosso blog: