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Se você cuida de uma criança com diagnóstico ou suspeita de autismo, é bem provável que já tenha se sentido sobrecarga em algum momento. Os desafios de lidar com comportamentos e entender as nuances e diferentes percepções de uma pessoa no Transtorno do Espectro do Autismo são inúmeros, por isso é comum que famílias – especialmente as mães, que representam 86% dos cuidadores principais segundo o estudo Genial Care – acabam tendo menos tempo para si mesmos e se esquecem da importância do autocuidado.
“Parece que você não vai dar conta de fazer nada da lista enorme de coisas que você tem pra fazer, é um sentimento de incompetência, é um sentimento de ingerência, é uma coisa muito, muito ruim mesmo, sabe? É um sentimento muito ruim”, define a jornalista e fundadora do Instituto Lagarta Vira Pupa, Andréa Werner.
Mãe do Theo, de 12 anos, Andréa é ativista na causa do autismo e já ajudou inúmeras famílias por meio de seus relatos pessoais e projetos que envolvem maior conscientização. Para ela, é difícil até trazer à mente a primeira sensação de sobrecarga.
“O sentimento que eu tenho é que isso é uma constante na minha vida, sendo muito honesta. E eu não sei se isso é comum a todas as mães e principalmente a todas as mães de crianças e ou adolescentes autistas, mas a sensação que eu tenho quando eu fico sobrecarregada é exatamente o que eu tô sentindo nesse momento é que eu tenho tantas coisas pra fazer juntas que a vontade é jogar tudo pra cima e não fazer nada. É um sentimento muito desesperador”.
Assim como ela, muitas famílias vivem essa constante sensação de sobrecarga. No mesmo estudo da Genial Care, 48% dos respondentes determinaram “falta de tempo para si mesmo e para se cuidar” como a terceira principal necessidade em que mais precisam de ajuda. Te ajudamos agora a entender mais sobre esse sentimento e como ele prejudica o desenvolvimento da criança e impacta o bem-estar de toda família agora.
Coloque a máscara primeiro em você
Sempre que fala sobre a importância do próprio bem-estar e o impacto dele em toda família, nossa líder clínica Ashley Curcio usa a analogia do avião: quando estamos prestes a decolar em uma viagem, a equipe de comissários dá avisos importantes sobre como devemos agir em emergências. A primeira delas é justamente que se algo acontecer, o cuidador deve colocar a máscara de oxigênio primeiro em si mesmo para, depois, ajudar a criança ou outra pessoa.
Essa analogia não só é perfeita como explica de forma simples algo que muitas famílias se esquecem: que o autocuidado é tão importante quanto o cuidado com o outro. Se você não se sente bem, a criança também e a dinâmica familiar como um todo será impactada. Pode parecer até frase de efeito, mas é cientificamente comprovado.
Quando falamos de autismo, a regulação emocional ainda carrega outro fator: cuidar das emoções pode contribuir com a saúde do núcleo familiar como um todo e com o aprendizado do autista. Isso acontece porque se torna possível observar comportamentos e pensar quais estratégias e intervenções podem ser realizadas diante de uma situação desafiadora com a sua criança para que ela também aprenda como se expressar positivamente diante daquela questão. Lembre-se da pirâmide de Maslow:
Quando a mãe se sente culpada
Muitas vezes, a sobrecarga é também um reflexo da culpa e incapacidade que as mães sentem em se cobrar para fazer o melhor por seus filhos. Se isso também acontece com você, voltamos a reforçar: você não está sozinha!
Andréa relata que, para ela, a culpa vinha acompanhada de remorso por ter tomado tal atitude ou não ter feito tal coisa no passado.
“Se eu pudesse voltar lá atrás no diagnóstico do Théo, eu faria muitas coisas diferentes, porque hoje em dia, o nível de conhecimento que eu tenho é bem diferente. Então, tem algumas terapias que ele fez, que eu não faria mais. Só que na época, eu fiz o melhor que eu podia com as informações que eu tinha. E é isso que eu aprendi muito com a terapeuta, a botar na minha cabeça e ficar repetindo como um mantra. E é assim hoje em dia também. Hoje em dia, eu faço o que eu consigo fazer com as ferramentas que eu tenho, com as informações que eu tenho. Então, é com esse tipo de coisa que eu tento lidar não só com sobrecarga, mas também com a questão do sentimento de culpa, lembrando sempre que eu tenho que tentar ser a melhor mãe que eu consigo ser”.
Ela ainda reforça a importância não só de olhar para a criança e quais terapias ela precisa para se desenvolver, mas, também, procurar ajuda profissional para si mesma. Desde o diagnóstico de Theo, ela faz terapia, embora tenha parado por alguns períodos, segue fazendo um acompanhamento.
“Eu acho que toda mãe lida com o sentimento de culpa, sobrecarga e de incapacidade. Constantes, assim, isso é uma coisa que toda mãe lida, mas eu acho que na maternidade atípica, isso vem dobrado, triplicado, porque parece que além de todas as culpas que a maternidade joga em cima da gente, na maternidade atípica, jogam também em cima da gente a culpa pelo tanto de habilidades que ele adquire ou não. Então, se ele não aprendeu a falar, é porque você, mãe, não se esforçou o suficiente, não estimulou o suficiente, não achou as terapias certas pra ele. Ou não colocou ele na dieta, ou não fez a terapia tal. Isso tudo vem em cima da gente, né? Então, é essencial a gente fazer terapia pra entender”.
O que você pode fazer?
Controlar as próprias emoções é um dos primeiros passos em sua busca pelo bem-estar e evitar a sobrecarga. Afinal, a regulação emocional é a habilidade que um indivíduo tem de gerenciar seus próprios sentimentos, pensamentos e comportamentos. Descobrir estratégias e atividades que contribuam com a regulação das nossas emoções é essencial para o nosso dia a dia, para a saúde das nossas relações e principalmente para nós mesmos.
Cada pessoa é e age de uma forma diferente. Por isso, não existem regras padronizadas para cada uma, mas compartilhar experiências e desafios é um bom começo. Para Andréa, o que tem funcionado é o seguinte:
“Eu tento fazer listas assim e priorizar coisas e tentar ir me livrando principalmente do que é mais difícil de fazer, ou do que é mais chato de fazer, porque eu tenho a tendência de ir empurrando as coisas que são mais difíceis ou mais chatas. Isso é uma tática e tem muito a ver com o fato de eu ter Transtorno de Déficit de Atenção (TDA) também. E eu tento sempre ficar repetindo na minha cabeça que eu não sou infalível, eu não sou perfeita e que isso não existe, isso não existe, e que ninguém dá conta de tudo, quem fala que dá conta de tudo está mentindo, né?”
“Todas as mulheres, mães, estão sobrecarregadas, principalmente nesse cenário de pandemia e eu não sou diferente de ninguém. É isso, é tentar tirar essa esse sentimento de que eu tenho que ser a diferentona supermulher, porque ninguém é. Isso não existe”, pontua.
Lembrete: conhecemos o desafio de educar uma criança com autismo. Criamos instrumentos e guiamos a família nessa jornada, por meio de capacitação parental com módulos de educação que variam de acordo com o nível de transtorno, mensuração de resultados e precisão clínica, com evidências científicas e tratamentos focados em cada indivíduo.